Distorção
Alteração da onda sonora original. Pode consistir numa adição ou numa subtracção de elementos, com destruição total ou parcial de alguns deles.
Augoyard considera a distorção como uma forma de filtragem. Não é essa a minha opinião, até porque muitas formas de distorção consistem não apenas em subtrair elementos quantitativamente mensuráveis, como faz a filtragem, mas também em acrescentar-lhe elementos – por exemplo, multiplicando a quantidade de harmónicos ou introduzindo ruído.
Em muitos casos a distorção ocorre contra a nossa vontade, mas pode também ser voluntária. Algumas formas de distorção são-nos de tal forma habituais, que já nem as identificamos como tal – é o caso do telefone analógico: o comprimento extremo dos cabos filtra as frequências altas, introduz ruído de fundo e provoca algumas alterações à forma de onda.
De facto, todos os meios analógicos e electroacústicos de captação, transmissão e reprodução distorcem inevitavelmente o som. A eterna luta técnica contra a alteração indesejada da reprodução sonora deu origem ao conceito de «alta fidelidade». Contudo, só os meios de transmissão digitais conseguem evitar a distorção. Ora, como nos dois extremos da cadeia de produção sonora (a captação e a reprodução) tem de haver aparelhos analógicos (respectivamente o microfone e o altifalante), não conseguimos anular completamente a distorção. Além disso, a reprodução digital do som em toda a sua «pureza» exigiria a transmissão de uma quantidade de informação digital que geralmente não é praticável nem económica (mais transmissão de informação implica maiores custos de produção), de forma que no quotidiano a transmissão digital acaba igualmente por ser acompanhada de distorções e outras deformações do som.
Expressões mediáticas
Quando o processo que levou à introdução de distorções num circuito electroacústico é conhecido, podemos invertê-lo parcialmente no final da cadeia de produção. É o caso dos sistemas Dolby usados nas salas de cinema.
Noutros casos a distorção é propositada: apesar de os meios digitais envolvidos, por exemplo no telefone/telemóvel, permitirem em teoria uma grande pureza de transmissão – descontada a natureza rudimentar dos microfones e dos altifalantes –, os custos envolvidos na quantidade de dados digitais que teriam de ser transmitidos levou os fabricantes a apostarem em estudos psicoacústicos, desde o início do século XX. O objectivo inicial da psicoacústica consistia em descobrir formas de filtrar e subtrair informação acústica na linguagem falada, sem no entanto impedir a compreensão dos conteúdos transmitidos, a fim de reduzir os custos de produção e obter maiores lucros. Por outras palavras, uma grande parte da distorção propositadamente introduzida nos telefones digitais, bem como nas transmissões de rádio e televisão, é produto de factores económicos. (Ver também a história da psicoacústica e do mp3 na Wikipedia, [fr], [en].)
O MP3 é hoje uma técnica comum de filtragem e compressão de dados, assente em estudos de psicoacústica e usada pela generalidade dos aparelhos postos ao alcance dos consumidores. O resultado, na maior parte dos casos, é a transmissão de dados sonoros amputados e distorcidos, sem que o utente se queixe desse facto. Esta aceitação pacífica da enorme baixa de qualidade sonora introduzida pelo MP3 e outras técnicas afins demonstra o interesse da abordagem multidisciplinar do som: a percepção e o sistema cognitivo humano, bem como as práticas sociais e culturais, envolvem vectores que vão muito além dos simples aspectos quantitativos estudados pela acústica e até dos aspectos qualitativos estudados na abordagem musical.
Por outro lado, numerosos artistas tiram partido da distorção, filtragem e modulação – a obra de Laurie Anderson é um caso exemplar.
visitas: 2