Dessincronização
A dessincronização coloca um som fora do seu contexto temporal (recordemos que a dimensão principal do som é o tempo). É portanto uma variante da descontextualização, um caso particular ligado sobretudo às artes cinematográficas.
Expressões mediáticas
A dessincronização é muito comum no cinema. O realizador Jean-Luc Godard recorreu muitas vezes a experimentações semânticas de dessincronização e descontextualização: dessincronizando o som em relação à imagem, ou apondo à imagem sons que à partida não seriam espectáveis naquele contexto.
Também o cinema italiano da mesma época (neo-realismo e nouvelle vague) é profícuo em dessincronizações entre a imagem e a fala. Os filmes de Federico Fellini, por exemplo, têm esta característica recorrente: a fala que ouvimos não corresponde ao movimento dos lábios da personagem. Corre a anedota de que Felini mandaria muitas vezes os seus actores contarem «um, dois, três, …» e mais tarde, em estúdio, sobreporia a fala prevista para essa cena – fala essa que poderia ser declamada por qualquer outro actor, especialmente quando o realizador usava actores desconhecidos do público. A justificação para este «truque» é simples: o realizador parte do princípio que quando o espectador vê os lábios do personagem mexerem e em simultâneo ouve uma fala, a sua percepção «cola» a fala à personagem, deixando de se preocupar com o sincronismo entre ambas. 1
Sociologia e cultura quotidiana
O caso mais natural de dessincronização ocorre durante as trovoadas. Como a luz, à escala humana, progride de forma praticamente instantânea, mas o som progride (no ar, em condições médias de temperatura e pressão atmosférica) à velocidade de 343 metros por segundo, raramente o som do relâmpago que vemos coincide com o trovão que ouvimos. Se contarmos o intervalo de tempo entre um e outro, e se esse intervalo for, por exemplo, de cerca de 3 segundos, ficamos a saber que o relâmpago ocorreu a cerca de 3 x 343 m = 1 quilómetro de distância.
Se quisermos abstrair ainda mais o efeito de dessincronização, generalizando-o a todos os casos em que o som expectável não ocorre e é substituído por outro, temos o caso das falas cortadas: quando a cadência rítmica de um diálogo é quebrada por um dos intervenientes, que corta a palavra ao outro ou se sobrepõe a ele. Neste caso o paradigma tem um âmbito eminentemente social e comunicacional.
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